Ontem foram divulgadas as contas nacionais relativas ao segundo semestre de 2017 (link aqui). Comparado ao trimestre imediatamente anterior e ao mesmo trimestre do ano anterior o PIB apresentou crescimento de 0,2% e 0,3%, respectivamente. A notícia é boa, principalmente por ser a segunda vez seguida que o PIB cresce em relação trimestre anterior depois de uma sequência de quedas. Na comparação do acumulado do ano com o acumulado do ano anterior o PIB ficou parado, ou seja, estamos onde estávamos no primeiro semestre de 2016, o que significa que recuperamos a queda do segundo semestre de 2016, mas não passamos disso. Se compararmos os quatro últimos trimestres com os quatro trimestres anteriores a queda é de 1,4%, ou seja, ainda não recuperamos a queda dos últimos trimestres do governo Dilma. A figura abaixo ilustra esses números.
Para entender melhor o que está acontecendo e até que ponto estamos mesmo testemunhando a saída da recessão é necessário olhar os números com mais detalhes. A figura abaixo mostra a decomposição da taxa de crescimento do PIB em relação ao trimestre imediatamente anterior. Repare que a agropecuária, que puxou o crescimento no trimestre anterior, não cresceu neste trimestre. De certa forma é um resultado surpreendente, pois por conta do crescimento significativo no trimestre anterior a expectativa era de queda neste trimestre. Tal expectativa fez com que vários analistas projetassem queda no PIB para este segundo trimestre. A indústria encolheu 0,5% e os serviços, que respondem pela maior parte do PIB pela ótica da produção, aumentou 0,6%. Esses números sugerem uma recuperação que pode antecipar uma retomada no crescimento. Ao que parece começamos a caminhada para voltar para onde estávamos antes da crise, nesse momento o esperado é que o setor de serviços lidere o processo. Isso também é consistente com a recuperação do emprego, dado que o setor de serviços é o que mais emprega no Brasil.
Pelo lado da demanda o destaque vai para o consumo das famílias. Parte do aumento do consumo pode estar relacionada a melhora no salário real devida a trajetória de queda da inflação e/ou a liberação de recursos do FGTS. O investimento continua caindo, o que é preocupante, mas caindo menos. Também é possível ver o resultado do esforço fiscal, se não estamos vendo uma queda no gasto a queda no consumo do governo pelo segundo trimestre consecutivo é um sinal que paramos com o ajuste onde o governo consome mais e as famílias apertam o cinto que ocorreu em períodos anteriores. A minha leitura dos números é que eles são compatíveis com uma recuperação puxada por serviços que já tem efeitos sobre consumo, mais ainda não se reflete no investimento. Não é o sonho da maioria dos economistas, mas pode ser o começo de uma recuperação sólida. A última coisa que precisamos é um ciclo de alta de investimento empurrados por subsídios que vai desaguar em uma nova crise. Primeiro é preciso crescer com mais gente trabalhando e/ou com os que estão trabalhando gerando mais produtos, depois, a medida que as máquinas que estão desligadas voltem a funcionar é que se espera a compra de novas máquinas, ou seja, o aumento do investimento é posterior a recuperação via emprego e/ou produtividade do trabalho. Nesta perceptiva é bastante razoável que o crescimento esteja vindo dos serviços.
A figura abaixo mostra a comparação do segundo trimestre de 2017 com o segundo trimestre de 2016. Esses números dão uma perspectiva de prazo maior que os anteriores pois são afetados pelo aconteceu no segundo semestre de 2016 e no primeiro trimestre deste ano. Na ótica da produção é possível ver o excelente desempenho da agropecuária e a queda da indústria. Parte desta queda veio dos períodos anteriores, mas, como pode ser visto na figura anterior, também houve queda neste trimestre. O destaque negativo da indústria foi a queda de 7,0% na construção, essa queda foi fundamental para chegarmos a queda de 2,1% no período. A indústria de transformação, aquela que tira o sono dos desenvolvimentistas, caiu 1% em comparação ao segundo trimestre de 2016. Quem realmente evitou uma queda maior da indústria foi o crescimento de 5,9% da extrativa mineral, um setor que costuma ser melhor explicado por eventos externos do que internos. Os dados pela ótica da despesa reforçam a tese que estamos trocando o ajuste via sacrifício de consumo das famílias por um ajuste via sacrifício do consumo do governo, ponto para a equipe econômica. A queda no investimento é preocupante, mas deve ser vista como na análise no final do capítulo anterior, ou seja, não devemos forçar o investimento.
A análise dos dados que comparam os quatro últimos trimestres com os quatro trimestres anteriores, dados que são mais influenciados pelo final do governo Dilma, reforça os resultados anteriores. Destaque para o crescimento da agropecuária quando olhamos pela ótica da produção e com o ajuste no consumo das famílias mais intenso que o ajuste no consumo do governo quando olhamos pela ótica da demanda. Boa parte do ajuste do consumo do governo, vale lembrar, ocorreu nos últimos trimestres. Os números estão na figura abaixo.
O processo de recuperação fica mais evidente na análise de longo prazo. A figura abaixo mostra o crescimento do trimestre relativo ao mesmo trimestre do ano anterior desde 1996. Nela é possível ver que após o longo período de queda iniciado em 2014 a taxa de crescimento volta a ser positiva. Pequena, é fato, muito pouco para relaxar, mas considerando o desastre deixado pelo governo Dilma já podemos ter esperança. Para que a esperança não vire frustração é fundamental que o governo tenha paciência e espere que a recuperação ocorra em ritmo natural, é particularmente importante não cair na tentação de forçar o investimento para acelerar o crescimento. Tenho certeza que a equipe econômica sabe disso e vai fazer o possível para manter a recuperação nos trilhos, espero que a equipe política segure a onda.