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  • Siegrid Guillaumon

Me Explique Aí! Por que não falamos em pedagogia do terceiro grau?


“O homem só conhece a si mesmo na medida em que conhece o mundo; ele se torna consciente de si mesmo somente dentro do mundo, e consciente do mundo somente dentro de si mesmo. Cada objeto, bem contemplado, abre um novo órgão da percepção dentro de nós”.

Com esta reflexão Goethe apontava para a natureza relacional da aprendizagem do indivíduo em contato com o mundo e em contato consigo mesmo. A pedagogia é o campo científico dedicado ao estudo da aprendizagem, na qual interessam questões como: é possível aprender? Como os indivíduos aprendem nas diferentes faixas etárias? Quais métodos podem ser mais adequados aos diferentes conteúdos ensinados? Como se consolida o conhecimento? Dentre outras inúmeras questões.

Durante todo o período que convencionamos denominar de ensino fundamental e médio, os indivíduos desenvolvem a aprendizagem tendo contato com diferentes campos do conhecimento e diferentes professores com licenciatura, ou seja, habilitados em conhecimentos suficientes sobre esta importante relação ensino-aprendizagem.

Quando os jovens ingressam no ensino superior, abruptamente experimentam um contexto de aprendizagem muito diferente. Neste nível, o professor, que agora é simbolicamente chamado de docente e pesquisador, deverá possuir domínio profundo dos conhecimentos e repertórios específicos das disciplinas que ministra; deverá ser capaz de fomentar e conduzir pesquisas; deverá ser capaz, portanto, de criar conhecimento; deverá possuir habilidades para gestão de esferas institucionais como coordenação de curso, chefia de departamentos; e deverá ter domínio da regulação do ensino pelo MEC. Apenas um parcela ínfima das atribuições do docente serão endereçadas para a reflexão contínua sobre a prática docente. Muito menos para a prática compartilhada desta reflexão. Como se o docente não precisasse mais de mentoria nos desafios do ensino na universidade. Como se o docente em algum momento fosse este ser completo.

Mas me explique aí quem é o estudante do terceiro grau?

Em média, é um jovem. Um jovem em pleno processo de descobertas do mundo à sua volta, em busca de conhecimento sobre si mesmo, com muitas dúvidas sobre a profissão que precocemente escolheu. A partir da adolescência o jovem vai se tornando responsável pelo seu destino, mas esta ainda é uma situação desconfortável para ele. Já está apto para arcar com a consequências de seus atos, mais ainda não exerce plenamente esta aptidão. Vai iniciar sua vida de trabalho e estar mais exposto ao ambiente externo. Há uma tensão grande entre o ideal e suas reais necessidades, desejos e instintos. O jovem está em conflito. Quer realizar sua imagem ideal que o leva a projetar o que gostaria de vir a ser. Está à procura de si mesmo. Está procurando as semelhanças e diferenças entre si mesmo e o contexto familiar que até então vem experimentando. Gudrun Burkhard (Tomar a Vida nas Próprias Mãos, 2010, p. 64) descreveu o sentimento do jovem: “estou aqui com toda minha potencialidade e quero transformar o mundo”. Este sentimento junto com a limitada capacidade autônoma de realização vem acompanhado de uma percepção de não ser compreendido, de solidão. E para eliminar a solidão o jovem procura estar sempre em grupo. Pertencer. A forma de comunicação encontrada é a crítica a tudo e a todos. Nesta fase a aprendizagem não ocorre a partir da imitação (como em fases anteriores), e nem da autoridade – e sim da liberdade. Podemos falar de uma liberdade interna e externa. A liberdade externa se conquista à medida que agimos no mundo externo e assumimos a responsabilidade pelos nossos atos. A liberdade interna é sútil. É o respeito à personalidade do outro, é a conscientização de que, como adulto, agora ele tem uma individualidade diante de si.

Mas me explique aí, como é que nós docentes entramos em contato com este momento de 50 jovens em sala de aula cujos objetivos estão estabelecidos nas ementas e conteúdos programáticos?

Peter Senge menciona que a maior de todas as invenções humanas é o processo criativo, a capacidade de criarmos novas realidades. Falar do fortalecimento de uma pedagogia do terceiro grau é tomar consciência de que o futuro será muito diferente do passado, lócus temporal para o qual lançaremos nossos jovens estudantes. Como nós docente nos preparamos para ensinar a partir da liberdade e para fortalecimento da individuação? Fica o convite para desenvolver esta pedagogia.

Argonauta Atalanta

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